quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Entrevista com Antonio Candido



Antonio Cândido, escritor, militante durante o governo Vargas e professor emérito da Universidade de São Paulo, ao longo de seus 89 anos, editou diversos livros e trabalhou como professor de pós-graduação e crítico literário. Antonio Cândido recebeu a equipe do Untitled em sua casa para uma entrevista sobre a influência dos livros na sociedade brasileira e em si mesmo.

Untitled: Como começou sua relação com os livros?

A.C: Eu acho que o livro, como tudo na vida, pode ser objeto de atração maior, ou menor. Meu pai e minha mãe tinham biblioteca em casa, não muito grande, porque parte da nossa biblioteca tinha ficado no Rio de Janeiro onde nós morávamos, mas uma biblioteca muito boa. Então eu gostava de livros, sempre gostei e eu tinha uma grande ânsia para aprender a ler. Eu gostava muito de ler, por exemplo, livro de leitura para a escola primária, que tinha estorinhas, poemas e eu desenvolvi um grande interesse pelo objeto do livro em si. À medida que eu fui crescendo, quando eu ia numa casa eu me sentia atraído pelo livro, não pelo móvel, pelas pessoas, ficava olhando... Então eu acho que há certas pessoas que têm amor pelo livro. Há intelectuais que se interessam, sobretudo, pelo conteúdo do livro, a mim interessava também pelo livro. Tanto é assim que eu sempre comprei muito mais livros do que tinha necessidade. E tem outra coisa: você sabe que o professor depende muito dos livros, para preparar aulas, para resolver problemas dos alunos. Comprava por prazer porque era um vício. Eu quando era moço deixava até de fazer despesas essenciais para comprar livro.

Untitled: Você sentiu diferença no livro como produto e como fonte de interesse de quando você era pequeno ao longo da sua vida?

A.C: Aqui no Brasil, do meu tempo de menino para cá a quantidade de livros cresceu extraordinariamente, inclusive havia editoras que mandavam imprimir os livros na Europa. O maior editor de literatura, o mais importante era o Garnier do Rio de Janeiro, os livros eram impressos em Paris, porque ele era editor na França e no Brasil. Aqui editava-se poucos livros, mandavam editar muito em Portugal e as editoras portuguesas editavam muitos autores daqui. O primeiro tipo de livro que começou a ser feito aqui no Brasil foi o livro didático, por um português chamado Francisco Alves. Monteiro Lobato foi muito importante porque ele disse “nós precisamos ter um livro brasileiro com cara brasileira, nós ficamos imitando livro francês, português”, então ele criou a Editora Monteiro Lobato. Enfim, isso foi crescendo, quando eu era menino, na década de 30 as editoras se multiplicaram muito e hoje em dia é um mar. Mas as tiragens são sempre relativamente pequenas. Mas o Brasil sempre absorveu pouco livro, é um país de pouca leitura. Na cidade de Buenos Aires há mais livrarias do que em todo o Brasil. A Argentina tem uma população de 30 milhões de habitantes e o Brasil de quase 200 milhões. Lê-se muito mais na Argentina do que no Brasil.

Untitled: E agora com o advento da tecnologia, você sentiu muita influência no hábito de ler com todas essas fontes de informação?

A.C: Eu me desliguei da Universidade quando a televisão ainda não tinha esse volume fantástico que tem hoje, mas o que eu observo hoje em dia é que as crianças que gostam de história e narrativa, que antes ficavam lendo livros infantis, passaram para os quadrinhos e televisão. Então já ouvi falar que a televisão poderá matar o livro. Agora, a idéia é saber se outros processos vão substituir o livro. Isso é muito difícil para um homem da minha idade avaliar. Eu respondo um pouco como o meu amigo José Mindlin. Ele respondeu “Eu não sei se é possível haver um mundo sem livros, creio que não. Mas se for possível um mundo sem livros, eu não gostaria de viver nesse mundo.”



4 comentários:

Tatiane Leiser disse...

Gente, nossa, parabénssss pela entrevista!!!
Ficou ótima!!!!

beijos

saudades de vocês

Rodrigo disse...

Eu sempre quis fazer isso que vocês fizeram. Tenho muita admiração pelo professor. Dois dias depois do meu aniversário, no entanto, posso dizer que provei um pouco do gostinho de conversar com ele: o encontrei na saída da minha colação de grau e fui caminhando sozinho com ele, do Expo Barra Funda até o ponto de taxi mais próximo. Foram 10 minutos de audiência privada com Antonio Candido, onde fiz poucas perguntas, nada a ver com livros, cultura, etc (olhe, considero a entrevista de vcs ótima, sem inveja), na verdade umas inquietações minhas, às quais ele respondeu com a maior naturalidade, olhando nos meus olhos. Isso está detalhado no meu blog, no post "Conversa com deus". Se quiserem ler... mas já antecipo que não tenho tanta inspiração, talento e bom gosto como vcs! Finalizando (ufa!), parabéns! E um abraço.

Liana Vidigal disse...

Bruno,

A entrevista está ótima. Contudo, o título precisa ser mais atrativo.

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Guilherme Lima disse...

Bem loca a entrevista, vocês precisam ver a entrevista do Saramago sobre o second life, pode ser interessante. Está no Youtube.

abçs

Gui